

O Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) decretou a ‘perda de delegação’ ao Delegatário do Ofício de Registro de Imóveis e Hipotecas, Registro de Títulos e Documentos e Civis das Pessoas Jurídicas da comarca de Porto Seguro, no sul baiano, Vivaldo Affonso Rego, por descumprimento de disposições legais e irregularidades. A decisão foi publicada no Diário Oficial da Corte desta quarta-feira (07).
Em abril, a Corregedoria-Geral de Justiça (CGJ) determinou a instauração de sindicância e afastou cautelarmente o delegatário por descumprimento das disposições legais na análise e registro da Certidão de Regularização Fundiária (CRF) vinculada ao procedimento de Regularização Fundiária Urbana (REURB) do Núcleo Jambreiro, formulado pela Prefeitura de Porto Seguro. O ato ilícito resultou na duplicidade de matrículas e registro de áreas sobrepostas.
De acordo com a decisão do desembargador Roberto Maynard Frank, corregedor-geral de Justiça, a regularização fundiária foi feita em uma área que pertence à empresa Paraná Export Indústria e Comércio de Café Ltda. Na mesma decisão, o corregedor ainda aponta que as testemunhas apresentadas pela defesa afirmaram que o cartório tinha ciência de que a área objeto da REURB possivelmente estaria vinculada a uma matrícula anterior.
Roberto Maynard Frank apontou também que, pelas informações do processo, a empresa contratada pelos moradores para fazer a regularização fundiária da região, a Boaz Soluções, apresentou defesa técnica junto à Prefeitura de Porto Seguro alegando o cumprimento dos procedimentos de buscas cartorárias que autorizaram a continuidade da REURB na localidade.
Mencionando a relação entre o cartório e a Prefeitura da cidade do sul baiano, Frank foi duro e não poupou críticas à atuação do delegatário.
“A análise do arcabouço probatório indica que, repise-se, o Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Porto Seguro era um mero repositório de títulos encaminhados pela Prefeitura Municipal. Ao receber a documentação e pedidos daquele órgão municipal, o Delegatário não observava a veracidade e legalidade das informações contidas no requerimento, bem como sequer efetuava as buscas necessárias para verificar a existência das matrículas, com os seus respectivos proprietários e dimensão de área.”
Irregularidades apontadas pela CGJ
- não houve a aferição devida quanto à declaração de desconhecimento da área a ser objeto da REURB fazer parte ou não da Matrícula nº. 6.091, quando o próprio Município teria indicado, inicialmente, certa vinculação ou proximidade daquela;
- não houve aferição devida da declaração de que não haveria necessidade de retificar a área da Matrícula nº. 6.091, quando, aparentemente, a área a ser objeto da REURB fazia parte daquela e já não fazia mais parte da dominialidade do Município, uma vez ter sido encerrada desde os idos de 1990 e transmitida à particulares;
- não houve a aferição devida da informação de que se tratava de uma área urbana que poderia ser objeto de REURB, considerando que o Núcleo Jambreiro estava consolidado pela posse das pessoas que ali ocupavam, quando, a priori, pelo menos uma parte da área fazia parte de um imóvel rural constante na Matrícula nº 6.091 e suas matrículas decorrentes;
- não houve a aferição devida quanto à informação e registro de que a área da REURB não tinha proprietário identificado, quando uma parte da área da matrícula 6.091 havia sido desmembrada, por duas vezes, e transmitida a pelo menos dois outros roprietários;
- não houve a aferição devida quanto à informação se a comunicação no procedimento administrativo de REURB foi devidamente encaminhada aos confrontantes corretos, quando, em verdade, não houve a notificação da empresa ENECOL CONSTRUÇÕES E EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, nos exatos dados constantes na Matrícula 13.320 (decorrente da 6.091),então proprietária da área confinante e titular do domínio de parte da área sobreposta;
- não houve o cuidado de verificar a qualificação objetiva e subjetiva das matrículas e, em sendo necessário, promover a retificação da áreas antes da abertura de novas matrículas ou ao menos a expedição de nova devolutiva para verificar a legalidade integral do procedimento e título de CRF a ser registrado na serventia;
- não houve a aferição da observância dos princípios da continuidade e unidade matricial, quando da prática dos atos de registros, notadamente por lançar atos de registro sem a existência de anterior que lhe dê suporte formal e a obrigar as referências consectárias, bem como por propiciar a duplicidade de matrículas em torno de uma mesma área.
Como consequência, cerca de 800 imóveis que já tinham sido regularizados em favor de famílias e aos comerciantes da região podem ser afetados e terem seus registros cancelados, já que, pela decisão que decretou a ‘perda de delegação’ de Vivaldo Affonso Rego, ressalta que, mesmo sendo sua obrigação, “o Delegatário Processado não detém o conhecimento exato dos atos registrais praticados nas matrículas de sua serventia extrajudicial e tal circunstância culminou na abertura de cerca de 800 matrículas referentes ao Núcleo Jambreiro, objeto de Regularização Fundiária Urbana, cuja área se sobrepõe àquela da Matrícula nº 13.320 e 52.044, sendo que ambas são referentes a uma área rural”.