

Ausência de planos de fiscalização dos contratos de arrendamento, baixa quantidade de funcionários aptos a exercer essa função e sobrecarga de trabalho. Essas foram as principais falhas destacadas pela Controladoria-Geral da União (CGU) no relatório que investigou a gestão da Companhia das Docas do Estado da Bahia (Codeba), entre 2022 e 2023.
A BNews Premium obteve acesso à íntegra da auditoria que analisou dois contratos de arrendamento, ambos com 25 anos de vigência, que abrangem os portos de Salvador e de Aratu, localizado em Candeias, na Região Metropolitana.
Os contratos de arrendamento funcionam como uma espécie de “aluguel”, com a Codeba — companhia vinculada à Secretaria Nacional de Portos e Transportes Aquaviários do Ministério de Portos e Aeroportos (MPOR) — cedendo os espaços nos portos baianos por um valor pago mensalmente com período estipulado contratualmente (veja os detalhes contratuais mais abaixo).
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A auditoria aponta que haviam 13 acordos firmados até 2024. A análise da CGU considerou apenas dois contratos que, juntos, representavam mais de 40% da receita de arrendamento da Codeba em 2023 — cerca de R$ 55,4 milhões de R$ 133,5 milhões em números absolutos.
No âmbito da investigação, o órgão constatou que, em 2022, foram designados seis fiscais para o Porto de Salvador, com o objetivo de realizar vistorias do contrato de arrendamento nº 01/2017. Já para o Porto de Aratu — contrato nº 02/2021 —, 11 fiscais foram deslocados. Todos respondiam à Diretoria de Infraestrutura e Gestão Portuária da Codeba.
Em 2023, a fiscalização passou a ser exercida pela Comissão Permanente de Fiscalização de Arrendamento (CPFA), com o objetivo de aprimorar as vistorias. Com isso, 18 funcionários de todas as diretorias foram designados de forma multidisciplinar para realizar as fiscalizações — um colaborador a mais do que o previsto no modelo antigo.
O detalhe é que a estratégia de fiscalização da Codeba se mostrou ineficaz em ambos os casos, de acordo com a CGU — gerando, inclusive, “sobrecarga de trabalho atribuída aos poucos colaboradores que realizam a função”. Ou seja, nos dois cenários, o número de fiscais designados para as vistorias foi considerado insuficiente pela Controladoria.
De acordo com o órgão, foi observado que apenas o fiscal representante da Gerência de Desenvolvimento de Negócios — setor responsável pela CPFA — e de alguns fiscais da Gerência de Infraestrutura atuavam simultaneamente e de forma regular na fiscalização, o que prejudicou a eficiência do trabalho e aumentou a chance de erros.
O relatório da CGU destacou que “os demais fiscais não atuavam simultaneamente e de forma regular na fiscalização de todos os contratos, mas a partir do surgimento de demandas específicas relacionadas à área de atuação em que estejam lotados”.
Não ficou demonstrada a atuação regular e eficiente desta Comissão de Fiscalização durante os trabalhos de auditoria. A fiscalização dos contratos de arrendamentos portuários realizada pela Codeba demonstrou fragilidade. Isto deveu-se, especialmente, à sobrecarga de trabalho atribuída aos poucos colaboradores que realizam a função”, dizia um trecho do relatório da CGU.
Falhas na fiscalização e perda de prazo
A Controladoria-Geral da União ainda identificou que as fiscalizações realizadas em 2022 e 2023 não ocorreram de acordo com a programação inicial da Codeba. O detalhe é que, nos dois contratos, fica estipulada a necessidade de que essas fiscalizações sejam planejadas e executadas “dentro de uma periodicidade adequada para o acompanhamento regular das condições de operação e manutenção do arrendamento”.
Em ambos os contratos está previsto que a fiscalização pode ser exercida tanto pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), como também pela administração do porto — no caso, a Codeba. Em sua auditoria, a CGU destacou que a fiscalização deve ser realizada de modo sistemático, com a finalidade de verificar o cumprimento das disposições contratuais, técnicas e administrativas em todos os seus aspectos.
A falta de tempo e recursos adequados para planejar as atividades de fiscalização cria lacunas na atividade desenvolvida, permitindo que práticas inadequadas passem despercebidas e não sejam devidamente corrigidas. Não restou comprovada a existência de um planejamento adequado das fiscalizações realizadas nos anos de 2022 e 2023 referentes à execução dos referidos contratos de arrendamento”, afirmou um trecho do relatório da CGU.
Confira a programação de fiscalização dos contratos de arrendamento planejada pela Codeba:

Preto no branco
A BNews Premium obteve acesso aos detalhes contratuais dos dois acordos investigados e, com base nos números informados pela CGU, a reportagem calculou a arrecadação de ambos até o fim de 2024. Por ainda estar em vigência, o ano de 2025 foi desconsiderado da estimativa. Somados, as cifras arrecadadas alcançam, ao menos, R$ 112,7 milhões — valores que podem ser superiores devido a algumas bonificações previstas em contrato.
O contrato nº 01/2017 foi o primeiro analisado pela Controladoria. A área arrendada dentro do Porto de Salvador para movimentação de passageiros corresponde a quase 11 mil m2 — o que corresponde a menos de 10% da dimensão do terminal. O acerto firmado entre a Codeba e a Contermas ocorreu em julho de 2017, com término previsto para julho de 2042 (25 anos de vigência).
Como o valor de arrendamento mensal é de R$175.334,17, o BNews Premium fez a projeção das cifras arrecadadas entre julho de 2017 e e dezembro de 2025 — pouco mais de sete anos. Nesse período, mais de R$ 15,6 milhões foram arrecadados pela Codeba. A Contermas presta uma série de serviços ao Porto de Salvador, como:
- ordenamento e segurança nos acessos viários ao estacionamento do Terminal de
- chegada e saída de passageiros, tripulantes e visitantes;
- check-in e check-out para passageiros e tripulantes;
- escaneamento de bagagem;
- transporte de passageiros e bagagens entre o Terminal e a faixa de cais junto ao acesso aos navios e vice-versa;
- serviço trilíngue de orientação a passageiros, visitantes e tripulantes;
- controle de segurança e vigilância no embarque, desembarque e trânsito; e
- atendimento médico ambulatorial a passageiros, tripulantes e visitantes.
Já o segundo contrato (nº 02/2021) foi firmado entre a Codeba e a ATU12 em maio de 2021, com término previsto para maio de 2046 (25 anos de vigência). A área de arrendamento está localizada no Porto de Aratu, em Candeias, e possui 163,7 m2. Atualmente o valor fixo mensal é de R$2,3 milhões.
Sem considerar a parte variável calculada a partir da movimentação mensal de todas as cargas, ao final de 2024 apenas esse contrato rendeu em torno de R$ 97,1 milhões à Codeba. A área é destinada ao embarque e armazenagem de granéis minerais, especialmente fertilizantes e adubos, concentrado de cobre, minério de manganês e coque de petróleo. Dentre as principais atividades da ATU12 no Porto de Aratu, estão:
- preparação para início e término da operação a cargo do operador portuário;
- expedição terrestre da carga, conferência de documentos e processamento de informações na saída do arrendamento;
- pesagens, exceto as requisitadas pelo dono da carga;
- utilização de sistemas de correias transportadoras;
- atracação e desembarque de carga; e
- armazenagem e movimentação interna da carga.
Recomendações da CGU
Diante das diversas inconsistências encontradas pela Controladoria-Geral da União, foram feitas recomendações para o aprimoramento da fiscalização, mediante o planejamento de fiscalizações regulares e periódicas, elaboração de um plano anual de capacitação para os empregados e adequação dos planos de fiscalização aos normativos vigentes.
Além disso, a CGU ainda sinalizou que a Codeba instaure uma normatização e implantação de regras de alçada no âmbito da gestão dos contratos de arrendamento para torná-la ampla e, não apenas restrita ao aspecto da fiscalização de condutas tipificadas como infrações.

O que diz a Codeba
A BNews Premium questionou a Codeba sobre o relatório da CGU. Até o fechamento da reportagem, a companhia não respondeu aos questionamentos. O espaço segue aberto para manifestações.
Divulgação / Codeba