

O uso de chupetas ultrapassou a infância e alcançou uma dimensão inesperada, tornado-se uma tendência entre adolescentes, jovens e adultos na China. Os itens, sejam feitos de silicone ou borracha, são vendidos em plataformas de comércio eletrônico com o intuito de aliviar o estresse e melhorar o sono.
Essa utilização virou tendência em terras chinesas, mas a estranha prática tem se alastrado pelo resto do mundo, incluindo o Brasil, atraindo milhares de pessoas para as ferramentas de e-commerce que comercializam esses produtos.
Especialistas da área de saúde mental estão preocupados com as consequências dessa nova mania e alertam sobre os riscos do uso prolongado de chupetas por adolescentes, jovens e adultos.
Consumidores destacam que a sensação lembra a segurança trazida pela chupeta na infância, dizem que a chupeta proporciona alívio durante momentos de pressão no trabalho ou durante tentativas de abandonar o cigarro. Ou seja, os itens são usados em diversos ambientes, inclusive nas empresas.
Quem aderiu à mania, descreve – a como “confortável e útil para reduzir a inquietação”. Alguns profissionais da saúde ressaltam que a prática “pode intensificar a evasão de situações difíceis. Em vez de lidar com as adversidades, utiliza-se o objeto como elemento de fuga”.
Ethel Poll, psicóloga e coordenadora do Programa de Tratamento da Depressão da Holiste, respondeu, por meio de um ping pong exclusivo elaborado pela reportagem do BNews, e esclareceu melhor o assunto. Confira a seguir:
Site BNews (SB) – Essa nova tendência tem relação com o chamado ‘comportamento de rebanho’, isto é, quando as pessoas costumam copiar, seguir uma mania que se viraliza no mundo; algo comum nos dias atuais. Ela pode se tornar um vício?
Ethel Poll (EP) – O termo “vício” aqui precisa ser entendido com cuidado. O uso repetido e automático da chupeta, como principal forma de acalmar-se ou lidar com desconforto, pode se tornar um hábito compulsivo, difícil de interromper principalmente se a chupeta se torna único recurso de regulação emocional, limitando outras formas de enfrentamento. É preciso compreender esta tendência do ponto de vista particular, diferenciar o que é da ordem do modismo ou sem tem uma função subjetiva, estruturante para aquele sujeito.
(SB) – A utilização de chupetas por adolescentes, jovens e adultos pode denotar algum tipo de doença psicológica causada por um problema oriundo da infância?
(EP) – A utilização de chupetas por adolescentes, jovens ou adultos não significa automaticamente que exista uma doença psicológica, mas, em alguns casos, pode estar associada a questões emocionais ou a experiências da infância que deixaram marcas importantes. É preciso avaliar se é algo pontual para aliviar o estresse ou apenas um modismo ou comportamento ligado a grupos e redes sociais como função recreativa ou estética, sem vínculo com sofrimento psíquico ou se, por outro lado, este comportamento é algo persistente que indique algum algum tipo de sofrimento psíquico. É importante indagar nestes casos o que faz um sujeito, que já há muito tempo abandonou esta prática infantil, retomar o uso na fase adulta.
(SB) – Dentistas abordam riscos como o desalinhamento dos dentes, alterações na mandíbula e até dificuldades para mastigar. Mas, para a saúde mental, quais são os perigos da adoção desse hábito entre adolescentes, jovens e adultos?
(EP) – É sempre importante entendermos a situação de uma forma contextualizada e individualizada para não cedermos a generalizações grosseiras. Mas chama atenção os casos, por exemplo, em que a chupeta pode se tornar o único ou principal recurso para lidar com ansiedade, insegurança ou estresse, reduzindo a capacidade de desenvolver outras estratégias de regulação emocional. Podemos pensar que este hábito pode reforçar ou manter o sujeito em uma postura mais regressiva, infantilizada dificultando o enfrentamento das demandas e frustrações próprias da vida adulta, e pode até gerar constrangimento, bullying ou críticas, levando a isolamento e piora da autoimagem.
Mas é necessário avaliar, acima de tudo, se este comportamento não está mascarando questões emocionais não elaboradas, como traumas, lutos ou inseguranças originadas na infância e servindo forma reguladora, estruturante, uma defesa contra algo que não consegue lidar no momento. Penso que sempre devemos ter calma antes de abalar as defesas de um sujeito.
(SB) – Quais os principais riscos em curto, médio e longo prazo, do ponto de vista da saúde mental, caso esse estranho hábito infantil vire moda no mundo?
(EP) – Não acredito que o hábito gere grandes riscos à saúde mental; às vezes, pode estar ligado a uma forma de lidar com o que não vai bem, uma solução pontual passageira, que tenha uma função para aquele sujeito. Entendo que o mais importante é avaliar o porquê desta escolha específica, o que ela pode estar sinalizando, comunicando daquele sujeito.
(SB) – O que fazer, no caso de observarmos algum familiar com esse hábito, no intuito de fugir, por exemplo, do estresse?
(EP) – Como já sinalizei, o uso de chupetas por adultos pode ter significados psicológicos variados, e a compreensão depende sempre do contexto singular de cada pessoa, não é algo que possa ser interpretado de forma pragmática. Ao se deparar com este hábito com alguém próximo, é importante, ao invés de julgar ou criticar, ter uma conversa aberta, tentar entender o que o hábito representa para a pessoa e observar se a prática está associada a algum sinal de sofrimento psíquico para que ela seja encaminhada para um cuidado profissional.
Atualizado às 09h48 Redação Bnews