

Mesmo após a saída da ViaBahia da administração das BRs-324 e 116 no último dia 15 de maio, as rodovias federais baianas seguem dando dor de cabeça ao governo Lula e ao povo baiano. Inicialmente, a concessão foi entregue em caráter emergencial à construtora catarinense Melo Corrêa Engenharia por R$ 78,2 milhões até abril de 2026.
No entanto, a BNews Premium apurou que o contrato foi rescindido de maneira unilateral pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) no último dia 30 de julho, após o órgão constatar que a empresa descumpriu uma série de condições de habilitação exigidas na contratação.
Inclusive, já no dia seguinte, em 31 de julho, o consórcio Jardiplan, Biancar e MA Engenharia foi escolhido para substituir a Melo Corrêa — firmando um contrato de R$ 55,6 milhões até o dia 16 de abril de 2026. Após esse período, a expectativa é que a concessão definitiva das rodovias federais baianas seja definida.
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A reportagem obteve acesso com exclusividade a uma série de arquivos que atestam que a saída da Melo Corrêa ocorreu após o Dnit constatar irregularidades em documentos apresentados pela empresa para comprovar experiência técnica. Essas documentações foram fundamentais para que ela fosse escolhida.

Após o contrato ser rompido unilateralmente, a Melo Corrêa recorreu à 16ª Vara Federal Cível para tentar retomar a concessão das rodovias federais, mas viu seu pedido ser indeferido. Agora, a empresa catarinense tenta revogar a rescisão junto ao Tribunal de Contas da União (TCU). A BNews Premium destrinchou ambos os casos mais abaixo.
O litígio ainda não foi analisado pela Corte, mas caso a empresa catarinense obtenha êxito, a reversão da concessão da BR-324 (Salvador–Feira de Santana) e da BR-116 (Feira de Santana–divisa BA/MG) pode dar muita dor de cabeça para o Ministério dos Transportes e, consequentemente, aos baianos.
Entenda porque a concessão emergencial foi rescindida
De acordo com Nota Técnica nº 58/2025 usada pelo Dnit para validar a rescisão, a Melo Corrêa apresentou atestados emitidos pela concessionária ViaBahia que, em um primeiro momento, confirmaram a execução de serviços como guinchamento, inspeção de tráfego, fiscalização viária e operação de Centro de Controle Operacional (CCO).

No entanto, a própria ViaBahia retificou posteriormente as informações, afirmando que a Melo Corrêa não executou esses serviços durante o contrato referenciado. A divergência entre os primeiros documentos e a manifestação da direção da concessionária levantou sérias dúvidas sobre a veracidade das informações apresentadas.
A Procuradoria Federal junto ao Dnit foi consultada e ressaltou que documentos emitidos pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia da Bahia (Crea/BA) possuem presunção de veracidade, mas alertou que essa presunção não é absoluta e pode ser desconstituída mediante comprovação de inconsistências.
De acordo com o Dnit, apesar de ter sido notificada, a Melo Corrêa não apresentou novos documentos capazes de sanar as dúvidas. Para a área técnica do órgão federal, os indícios são suficientes para concluir que houve vício insanável na habilitação da empresa, o que compromete a legalidade da contratação emergencial.
A análise dos elementos constantes nos autos revela a presença dos requisitos legais para a rescisão unilateral do contrato, diante da evidência contundente de que a empresa contratada deixou de comprovar a manutenção dos requisitos de habilitação exigidos na contratação, especialmente no que se refere à qualificação técnico-operacional”, dizia um trecho da Nota Técnica nº 58/2025.
O órgão ainda ressaltou que manter o contrato nessas condições significaria “conivência com irregularidades” e violaria princípios constitucionais da administração pública, como legalidade, moralidade, isonomia e eficiência.

Empresa recorreu à Justiça Federal
Ter sido limada pelo governo federal irritou a Melo Corrêa Engenharia, que, no dia seguinte ao rompimento unilateral, em 31 de julho, entrou com um mandado de segurança junto à 16ª Vara Federal Cível. O objetivo era suspender os efeitos da rescisão unilateral do contrato até julgamento final da ação. No entanto, a Justiça Federal indeferiu o pedido.
Na ação, a Melo Corrêa argumentou que apresentou atestados técnicos e uma Certidão de Acervo Técnico (CAT) registrada no CREA/BA que comprovaram sua experiência em serviços de guincho, inspeção de tráfego e operação de CCO — documentos que teriam sido aceitos em diligência pelo próprio Dnit.

A empresa sustentou que a rescisão foi arbitrária, baseada em manifestação unilateral e posterior da concessionária ViaBahia, sem respeito ao devido processo legal. No entanto, o juiz Gabriel Zago Capanema Vianna de Paiva entendeu que as diligências administrativas comprovaram inconsistências que fragilizam a habilitação técnico-operacional da
empresa.
Na visão do magistrado, a Dnit seguiu os ritos legais ao rescindir o contrato, uma vez que foram identificadas divergências entre os documentos apresentados e os serviços efetivamente executados pela empresa junto à ViaBahia.
Assim, não teria havido violação ao contraditório ou à ampla defesa, já que a empresa foi ouvida durante o processo. Com o indeferimento da liminar, a rescisão do contrato permanece válida e a empresa segue impedida de operar os trechos das rodovias. A Melo Corrêa recorreu da decisão.
Ficaram comprovadas as divergências entre o atestado técnico apresentado e os serviços efetivamente prestados à ViaBahia, o que é suficiente para a rescisão contratual”, destacou o juiz na decisão.
Imagem aérea dos pedágios da BR-324 | Foto: Divulgação / ViaBahia
TCU entra na jogada
Após a negativa da Justiça Federal — e em meio à definição do Dnit sobre a nova empresa que iria administrar as BRs-324 e 116 —, a Melo Corrêa entrou com uma representação no Tribunal de Contas da União (TCU) pedindo a suspensão da rescisão do contrato emergencial para voltar a operar as rodovias federais baianas.
A decisão do Dnit, aprovada em reunião extraordinária de sua diretoria em julho, retirou a empresa da gestão dos serviços rodoviários menos de três meses após o início da execução. O contrato, assinado em maio de 2025, tinha valor de R$ 78,2 milhões e previa vigência até abril de 2026.

Segundo a empresa, já havia sido montada uma estrutura com 351 trabalhadores diretos, além de frota de veículos, equipamentos e serviços acessórios, como manutenção de fibra óptica, monitoramento por câmeras e sistemas de comunicação.
A Melo Corrêa sustenta que a decisão de rescindir o contrato provocou descontinuidade imediata de serviços essenciais, como guincho e atendimento de emergência, com reflexos sociais e econômicos relevantes.
No pedido ao TCU, a companhia afirma que a rescisão foi ilegal e precipitada, baseada em uma manifestação unilateral da concessionária ViaBahia, que teria emitido um novo atestado técnico contestando documentos apresentados inicialmente.
A Melo Corrêa lembra que, para ser contratada, entregou atestados técnicos e uma Certidão de Acervo Técnico (CAT) registrada no CREA/BA, que foram validados em diligência oficial do próprio DNIT antes da assinatura do contrato.

A Administração confirmou a veracidade das informações em diligência formal e, com base nisso, adjudicou e contratou. A reversão desse entendimento exige procedimento formal, motivação técnica qualificada e contraditório, o que não ocorreu”, argumenta a empresa na representação.
Outro ponto levantado pela defesa é que a rescisão contraria um precedente do próprio TCU (Acórdão nº 199/2025), que determinou ao Ministério dos Transportes e ao DNIT a adoção de medidas para garantir a continuidade dos serviços rodoviários nos mesmos trechos durante a transição da concessão da ViaBahia.
A Melo Corrêa pede que o TCU conceda uma medida cautelar para suspender imediatamente os efeitos da rescisão, evitando a desmobilização da sua estrutura e a contratação de outra empresa — situação que já ocorreu — e permitindo que volte a operar os serviços até o fim do prazo previsto.
O que dizem os envolvidos
A BNews Premium entrou em contato com o Dnit, que, por meio de nota, esclareceu que o contrato com a empresa Melo Corrêa “foi rescindido por descumprimento das condições de habilitação exigidas na contratação e que o caso está sendo apurado, observando o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, podendo ter as penalidades legais cabíveis aplicadas”.
A continuidade das operações na BR-324/BA e na BR-116/BA, até abril de 2026, foi assumida pelo Consórcio Jardiplan, Biancar e MA Engenharia. Em paralelo, está em andamento processo licitatório para a contratação de empresa que ficará responsável pelos trechos rodoviários, a partir desta data”, informou o Dnit à BNews Premium.
Por sua vez, a Melo Corrêa, através de sua equipe jurídica, destacou à reportagem queão há imputação de falsidade ou fraude. A empresa destcaou que, na verdade, “o que houve foi uma comunicação unilateral e superveniente da ViaBahia tentando retificar o que já havia sido atestado e validado, sem processo administrativo regular, sem ampla defesa e sem contraditório”.
A empresa confia que o Poder Judiciário e o Tribunal de Contas da União, no âmbito das suas respectivas competências, reconhecerão a ilegalidade do ato e determinarão a sua anulação, preservando a continuidade operacional e a segurança dos usuários, bem como a segurança jurídica da contratação.afirmou a Melo Corrêa por meio de nota enviada à BNews Premium.
Sheyla Santos / Agência Infra