

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a suspensão de todos os processos que discutem a suposta fraude na contratação de trabalhadores por meio de pessoa jurídica, prática conhecida como “pejotização”.
A decisão foi proferida, nesta segunda-feira (14), no âmbito do Recurso Extraordinário (ARE) 1.532.603/PR e está relacionada ao Tema 1389 da repercussão geral, que trata da constitucionalidade desse tipo de vínculo contratual.
A medida afeta milhares de ações trabalhistas em todo o país e, segundo o ministro, visa garantir “segurança jurídica” enquanto o mérito do tema não é julgado pelo STF. No entanto, a decisão foi recebida com preocupação por especialistas em Direito do Trabalho, que enxergam um possível risco de esvaziamento das garantias básicas dos trabalhadores.
Em entrevista ao BNews, o advogado trabalhista Ruy João Ribeiro classificou a suspensão como uma “interferência indevida na independência do juiz do trabalho”. Segundo ele, ao paralisar preventivamente todos os processos, o Supremo compromete a análise concreta das relações laborais, substituindo a avaliação de provas e fatos por uma “tutela abstrata e concentradora”.
“A crítica não é à competência constitucional do STF, mas à substituição da análise fática por uma tutela abstrata que nega a realidade social das relações laborais”, afirmou João.

A “pejotização” ocorre quando empresas contratam profissionais como pessoas jurídicas, eliminando vínculos formais de emprego e, consequentemente, obrigações trabalhistas.
Para o advogado, identificar se há fraude nesse tipo de contrato exige o exame de critérios como subordinação, habitualidade, pessoalidade e onerosidade, elementos que, segundo ele, só podem ser avaliados pela Justiça do Trabalho com base na prova dos autos.
A Justiça do Trabalho é historicamente incumbida de verificar, com base na prova, a existência ou não dos requisitos do vínculo empregatício. O princípio da primazia da realidade é a pedra angular dessa análise”, explicou.
João ainda criticou o impacto da medida para os trabalhadores que buscaram a Justiça para denunciar vínculos fraudulentos. Segundo ele, a decisão do STF paralisa ações importantes e representa um retrocesso no acesso à juridicidade.
“O efeito prático da medida é o congelamento de milhares de ações trabalhistas, impedindo o acesso efetivo à jurisdição e postergando por tempo indeterminado o julgamento de casos com fortes indícios de fraude”, destaca o especialista.
Além disso, o advogado aponta que a suspensão afronta garantias constitucionais como a celeridade processual e a efetividade da tutela jurisdicional. Para ele, a medida pode ser vista como parte de uma tendência de enfraquecimento da Justiça do Trabalho em prol de uma visão liberalizante das relações de trabalho.
Essa suspensão generalizada pode ser interpretada como tentativa de cercear a autonomia da Justiça do Trabalho em favor de uma leitura pró-mercado, tendência que vem se fortalecendo desde a ADPF 324”, completa João.
O julgamento do mérito do Tema 1389 ainda não tem data definida. Até o audiência, todas as ações envolvendo a situação permanecerão suspensas, e os trabalhadores que aguardam decisões sobre seus vínculos terão de esperar por uma definição do Supremo Tribunal Federal.
Gustavo Moreno | STF